25 Abril
Senhor presidente da Câmara
Municipal
Senhor presidente da Assembleia
Municipal
Senhores e senhoras autarcas
Representantes das Entidades Oficiais
Interrogo-me sobre o
que poderei, ainda dizer, sobre o 25 de abril de 74, que não tenha sido já
evocado, nas crónicas dos nossos jornais, na Biblioteca Municipal, nas escolas
do concelho, ou nas iniciativas das Juntas de Freguesia.
Celebrar 40 anos de
exercício democrático, convida-nos necessariamente, ao resgate da memória sobre
os trajetos históricos dos protagonistas que, antes e depois da revolução,
escreveram na História de Portugal e do mundo, o momento em que um povo se
aliou às forças militares para alicerçar a paz, a liberdade e o progresso.
Espaço esse,
multiplicado nas recordações de felicidade partilhada, de comprometimento
social e de envolvimento político.
Para além da luta destemida
que afrontou um regime e das cantigas que sempre envolveram quem as cantou, vou
aproveitar, a oportunidade de uma pergunta lançada por um jovem do Centro de Bem
Estar da Zona Alta que, no debate sobre o 25 de Abril, interpelou:
-“Como aparecem os
cravos vermelhos?”
Trago então à
lembrança, uma mulher anónima, uma das várias que, diariamente, ocupavam o
Largo do Rossio na venda de flores. Uma mulher que num gesto inusitado, sem
memória semelhante, oferece um cravo vermelho a um soldado, que o coloca num
cano de espingarda.
Imortalizada na imagem
de um garoto esticando o braço para florir a arma, a autenticidade de um
pequeno incidente, tornou-se, como agora se diz, viral. Inundou a multidão e trespassou
o tempo, até aos dias de hoje.
O gesto simbólico, deu
lugar à metáfora literal, de uma revolução feita de cravos. O sangue não
derramado, em flores.
Portugal ofereceu ao
mundo uma história onde a paz, gera a paz.
Mas este episódio não
seria importante em si, se não fosse revelador do impacto determinante, que
acompanha a ousadia de agir para além do óbvio, do esperado, ou de consensos
generalizados e tantas vezes desejados.
Se antes residia o medo
da polícia política e da guerra, agora o medo propaga-se nos hábitos
quotidianos, alimentando as fobias dos sistemas de vigilância e controlo, cada
vez mais sofisticados.
Se antes a propaganda
desenhava conformismos, agora a propaganda mascara-se de rebeldia, faz dos
valores uma etiqueta consumível, confundindo a dimensão das palavras e o
significado dos sentidos.
A panaceia da
tecnologia que “libertaria o homem do trabalho, libertou o trabalho do homem” o
que, a par de uma crise projetada para a criação de sociedades aflitas,
acentuou o desemprego, o desacerto e o desalento.
Os governantes sugerem
como solução, o recurso à nova diáspora portuguesa para a emigração, deixando
marcas profundas na nossa cultura, na demografia, no envelhecimento da
população.
Se antes existia um
inimigo partilhado, agora o perigo é um fantasma tentacular que, a educação instrumentalizada
para a resignação, para a subserviência, para a conveniência, para a anulação
da consciência crítica, ajuda a propagar.
E se antes o
analfabetismo caracterizava o povo português, agora a iliteracia ocupa lugar: o
conhecimento não ganha raízes, nem lança sementes.
Estes cenários, revelam
um País ofuscado pelos malabarismos de uma esfomeada economia neo-liberal que,
“oferece” tratados financeiros em troca do empobrecimento das populações e da
alienação dos direitos fundamentais consagrados.
A tudo isto não é
alheio o decréscimo da participação política nos últimos 40 anos, revelado recentemente,
pelo Instituto Nacional de Estatística.
Na luta pela liberdade,
“era preciso esperança para ter coragem, agora é preciso coragem para ter
esperança”.
As populações, as cidades
e os países, estão a manifestar globalmente, não apenas o cansaço próprio dos
sistemas que não se regeneram (corrupção, abuso de poder, gestão de
influências, distribuição desequilibrada das riquezas e direitos, desrespeito
pelos eco-sistemas e pela sustentabilidade ecológica), mas também, reclamam a
necessidade urgente, de repensar a nossa cultura social e a nossa atividade política.
Nesse processo,
precisamos reinventar as palavras, para mudar a realidade.
Vivemos a época em que as
respostas únicas faliram, dando lugar a múltiplos questionamentos. Por isso,
percorremos um tempo que convida a polifonias e forças, que abraçam todas as relações,
atravessam todas as pontes, redefinem todas as fronteiras.
Como nos lembra o
escritor e biólogo moçambicano Mia Couto: “O que fez a espécie humana
sobreviver, não foi apenas a inteligência, mas a nossa capacidade de produzir a
diversidade”.
Afinal, os sistemas democráticos, transportam
todas as fragilidades humanas que os fundamentam, obrigando a exercitar
vigilância crítica e um profundo sentido de ser.
Assim, este nosso tempo, é também ele,
composto de mudança.
Quando uma florista anónima
do 25 de abril 1974, traça um gesto poético no desenho de uma nação, numa
audácia de ser co-autora da revolução mostra-nos, o quanto somos importantes, na
nossa ação singular, para a colaboração coletiva.
Um pequeno gesto
autêntico, que se projeta nos processos associativos, nas coletividades, na
atividade política e nos projetos comunitários de proximidade, que alavancam o nosso
capital de esperança.
Mas este simples gesto, também
nos convida à abordagem da nossa atuação cívica e democrática alargada, na
escolha dos nossos representantes para o Parlamento Europeu, já no próximo mês de
Maio.
A cidade como centro de debate
e de cidadania ativa, estimula “inquietações solidárias e rebeldias
construtivas” que reforçam a sua arquitetura identitária, geradora de sentido,
constituindo uma poderosa ação política emancipadora.
Não é pois, inocente, a
ameaça que ensombra o exercício da autonomia local alicerçado, também ele, ao
longo destes 40 anos.
Hoje, é a partir do nosso
espaço de influência, o sentido de ser e a autenticidade de cada um, que nos
permite afrontar, qualquer gigantesco mecanismo de poder, colaborando
coletivamente, para a criação de um concelho, cuja história nos orgulha
pertencer.
É, necessariamente uma
opção diária, por isso, se hoje fosse o 25 de abril, em 2014, eu estaria certamente
na praça 5 de Outubro, em Torres Novas, a celebrar, como nos restantes dias do
ano, a liberdade de cada um e de todos…
O 25 de Abril é um
processo que também começa hoje!
O Bloco de Esquerda de Torres Novas, saúda todos os trabalhadores e
trabalhadoras, torrejanos e torrejanas, que lutam e acreditam no futuro que, há
40 anos fez o povo sair para a rua.
VIVA O 25 de ABRIL!