A
Democracia está suspensa em Torres Novas?
No dia 27 de Fevereiro de 2015, teve lugar,
nos Paços do Concelho, a Assembleia Municipal ordinária, que, pela Lei, tem que
ocorrer até ao final do mês de fevereiro.
Seria uma Assembleia Municipal normal, para tratar
dos assuntos agendados e para debater os temas que os partidos políticos
entendessem colocar, assim como questionar a Câmara sobre a sua atividade,
exercendo a sua competência de fiscalização do executivo camarário.
Mas não foi uma Assembleia Municipal normal!
No Período Antes da Ordem do Dia (PAOD) o
Bloco de Esquerda apresentou, por escrito, três (3) propostas e uma Moção para debate
e deliberação. Propostas sobre assuntos do concelho e uma Moção sobre um tema
da atualidade política nacional e europeia – Solidariedade com o povo grego e
repúdio pela atuação do Governo português.
O Presidente em exercício, José Manuel Trincão
Marques, colocou à votação da Assembleia a admissão da Moção e das propostas
para debate e votação.
Pela primeira vez, PS, PSD e CDS, assim como
os Presidentes de Junta não admitiram as propostas para debate e votação. Não
se ouviu um argumento porque é que não se podia debater. Apenas braços no ar
para negarem o direito de um partido a colocar a debate os assuntos que entende
serem pertinentes. Registe-se que sobre as propostas houve abstenções na
bancada do PSD. A CDU votou a favor da admissão.
De forma seletiva e sem argumentação, o PS
votou a favor da admissão da última proposta apresentada pelo BE (proposta 3)
sobre os registos áudio das sessões da Assembleia Municipal. Significativa foi
a afirmação do presidente em exercício. “Eu desta voto a favor”, antes de
colocar à votação a admissão da proposta, indiciando que existia um eventual
critério de substância na votação que apenas tinha como objetivo admitir ou não
admitir.
Mas, vamos por partes:
1 – A Assembleia Municipal é o órgão político por
excelência no município, onde o debate político e de ideias devem estar
presentes. Não é um órgão para ratificar as decisões da Câmara Municipal.
2 – Torres Novas não é uma ilha e a política
nacional e europeia têm impacto direto sobre a vida da sua população e a tomada
de posições, pela Assembleia Municipal, aproxima a política das pessoas e
promove a participação e a cidadania. Aliás sempre assim foi. São múltiplas as
tomadas de posição no passado.
3 – O Regimento da Assembleia Municipal prevê
no n.º 3 do artigo 18.º que a assembleia vote a admissão de proposta que não
constem da agenda. Faz sentido, pois podem ser apresentadas propostas que
precisem de estudo e não devem ser automaticamente admitidas. Mas também faz
sentido, como aliás era prática corrente, que sejam admitidas propostas que a
Assembleia entende que pode votar – como era o caso das propostas apresentadas
pelo BE, pois já tinham sido apresentadas à Assembleia anteriormente no PAOD e
Moções que se destinam a tomadas de posição política.
Registe-se, que não se ouviu um único
argumento para a não admissão das propostas e da Moção.
4 – O precedente agora aberto é muito grave, do
ponto de vista formal e do funcionamento da AM e muito grave do ponto de vista
político e do exercício da democracia.
Comecemos pelas propostas do BE:
Proposta 1 – realização de uma Assembleia
Municipal temática sobre a descentralização de competências para os municípios
na área da educação: assunto que diz respeito à vida dos municípios, que tem
mobilizado todos os envolvidos – municípios, Associação Nacional de Municípios
Portugueses, Professores/as, sindicatos, diretores de escola, associações de
pais e encarregados de educação. Tema da atualidade política. Uma proposta para
um debate aberto, envolvendo todos, para promover o esclarecimento, não foi
admitida, sem um único argumento. Quem tem medo do debate? Quem foge do
esclarecimento? Será que se prepara alguma negociação secreta sobre esta
matéria com o Governo e depois se apresenta como facto consumado?
Proposta 2 – Realização das Assembleias
Municipais (pelo menos as ordinárias) no Auditório da Biblioteca Gustavo Pinto
Lopes para proporcionar melhores condições de trabalho aos membros da
Assembleia e para proporcionar que mais munícipes possam assistir. O BE já
tinha colocado esta proposta em AM. Foi travada a sua admissão. Porquê? Reunir
em melhores condições prejudica quem?
Proposta 3 – Divulgação dos registos áudio das
Assembleias na net e envio para o Arquivo Municipal para memória futura.
Proposta admitida e aprovada a divulgação na plataforma da extranet municipal e
envio para o arquivo municipal. O debate em volta desta proposta também merece reparo,
pois todo ele se centrou numa questão que nem devia ser colocada – a
legitimidade de divulgar o que se passa na AM, tendo o presidente em exercício
chegado a dizer que não se podia fazer gravações das sessões sem autorização.
Tudo isto é caricato. Falamos de sessões que são públicas! Portanto, a sua divulgação não está em causa.
Aliás, como bem sabemos, são feitos relatos de intervenções pelos jornais,
citados entre aspas, que só podem ter sido gravados. Ou os jornalistas estão
impedidos de entrar e fazer o seu trabalho? Ou, ainda pior, têm que pedir
autorização para fazer o seu trabalho? Numa Assembleia Municipal, numa
Assembleia de Freguesia, numa reunião pública de Câmara, na Assembleia da
República, os/as eleitos/as sabem que tudo o que fizerem e ou disserem é
público e pode ser reproduzido. A questão não está na divulgação da informação,
está no acesso a essa mesma informação. Se cidadãos ou cidadãs do concelho
decidirem dirigir-se a Câmara Municipal ou à Assembleia Municipal e pedir as
atas ou outros documentos, eles têm que ser fornecidos e se não forem esses
cidadãos/ãs dirigem-se à CADA – Comissão de Acesso aos Documentos
Administrativos e as instituições são obrigadas a fornecer e ainda pagam uma
multa por não o fazer. A questão é outra e é política e sobre transparência: deve ser facilitado o
acesso às pessoas daquilo que já é público por natureza. Aliás, convém também
dizer que em Portugal, os únicos documentos que não podem ser divulgados – a
particulares e a jornalistas – são aqueles que estão classificados como
“segredo de estado”, o que não parece ser o caso de Torres Novas.
O ridículo da questão é que as atas estão na
net, mas o registo áudio não pode estar. Pode ler, mas não pode ouvir e muito
menos ver.
Cada vez mais municípios publicam na net as
intervenções, sejam escritas, sejam em vídeo. Utilizam as novas ferramentas
para divulgar o seu trabalho, para se aproximarem das populações. Em Torres
Novas parece que vamos em sentido contrário. E depois, a maioria PS ainda se
gaba do seu lugar no ranking da transparência…
Veja-se os seguintes exemplos:
A assembleia municipal de Lisboa tem um canal
de TV próprio.
Não se trata de pedir tanto para Torres Novas,
apenas que se inicie o caminho de promover o acesso dos/as munícipes aos
documentos e atividades da Câmara e Assembleia Municipais.
De que têm medo os eleitos/as do PS? Uma das
obrigações dos eleitos/as é prestar contas do que fazem e isso passa, sem
sombra de dúvida, pelos munícipes saberem que intervenções fazem, sobre que
temas e como votam.
Por último, a Moção de solidariedade com o
povo grego. Ninguém é indiferente à situação vivida na Grécia, após as eleições
legislativas de 25 de janeiro passado. As escolhas soberanas do povo grego
ditaram uma mudança no seu país com impactos muito significativos na Europa.
Nada será como dantes. E esses impactos têm diretamente a ver com a situação do
nosso país e dos portugueses. Trata-se, no fundo, de termos uma palavra a dizer
sobre como o governo português se comporta e que posições defende no Eurogrupo
e na União Europeia. Não podemos, nem devemos ser indiferentes às posições
tomadas por Passos Coelho e Maria Luis Albuquerque, posições servilistas e
“mais alemãs do que o governo alemão”. Para o Bloco de Esquerda é muito
importante fazer este debate e ninguém deve ser afastado dele. Por isso
apresentámos uma Moção.
Infelizmente, não existiu sequer um debate
sobre a substância política das propostas, não existiu argumentos a favor ou
contra. Existiu isso sim, veto de maiorias, que tem muito pouco a ver com
democracia. Do PSD e do CDS esperava-se, pois não quer que se discuta a posição
do governo. Mas de que tem medo o PS?
Só para informação convém dizer que Moções
idênticas foram apresentadas em várias Assembleias Municipais.
APROVADAS
moções nas seguintes Assembleias Municipais:
- LOURES - 18 votos a favor (1 BE, 1 MRPPP,
16 CDU) - 11 contra (6 PSD, 1 CDS e 4 PS) e 9 abstenções PS
- ODIVELAS - 12 a favor (2 BE + 10 CDU), 14 abstenções
(PS), 8 contra (7 PSD+1 CDS)
- PORTIMÃO - 15 a favor (10 PS, 3
BE e 2 CDU), 8 contra (4 PSD e 4 CDS//MPT/PPM) e 1
abstenção da CDU, por curiosidade o líder da bancada da CDU
- LAGOS - maioria
PS, o BE tem 1 deputado municipal, aprovada, desconheço pormenores da
votação
Foi ainda aprovada uma importante recomendação de geminação de
LISBOA com ATENAS
- ODEMIRA - 9 a favor (1 BE, 6 CDU e 2 PS),
14 abstenções (12 PS e 2 CDU) e 5 contra - 1 PSD, 1 CDS, 2
PS (incluindo a Presidente da AM) e 1 CDU!
- PONTE DE SOR - Aprovada com 3 Votos a
favor (1 do BE e 2 do PS) e 12 abstenções, 5 da CDU e 7 do PS
Moções REPROVADAS
- SALVATERRA DE MAGOS - a mesma moção
foi apresentada na Câmara e na Assembleia Municipal
AM - 10 contra (8 PS, 1 PSD, 1 MCI)
8 favor
(6 - BE, 2 CDU)
5 Abst ( 4 PS, 1 MCI)
CM - 4 Contra ( 3 PS, 1 PSD)
3 Favor (2
BE, 1 CDU)
- LEIRIA - 4 votos a
favor (1 BE, 2 PCP + 1 ???), abstenção do PS e votos contra do PSD + CDS +
alguns deputados do PS, incluindo a Presidente da AM
O Bloco de Esquerda continuará a apresentar
propostas sobre o concelho e sobre temas da vida política nacional e
internacional. O confronto de ideias e de propostas favorece a participação da
população. Não abdicamos deste direito e desta obrigação perante todos os
torrejanos e torrejanas.
Ou será que alguém suspendeu a democracia em
Torres Novas?